Por Gabriel Guimarães
Inio Asano |
Entre os anos de 2005 e 2006, o quadrinista japonês Inio Asano apresentou sua obra que viria a ter maior repercussão dentre suas criações. Centrada no rito de passagem para a vida adulta da jovem Meiko Inoue, a obra "Solanin" apresenta uma sensibilidade ímpar quanto às inseguranças do crescimento e aos anseios e batalhas pela realização de sonhos.
Ambientada no período pós-término de faculdade dos personagens, em Tóquio, ao mesmo tempo em que apresenta algumas cenas relacionadas ao tempo em que estes estudavam na faculdade de Tamagawa, onde se conheceram, a história apresenta um ritmo de leitura extremamente tranquilo e de fácil identificação. Perante o abismo do mistério que representa a vida adulta, Asano apresenta os questionamentos vividos pelos jovens japoneses que não querem apenas serem mais um em meio a um mundo mecanizado. A fim de fugir da rotina frustrante e dos constantes desentendimentos entre suas expectativas e a realidade, é que Meiko decide abandonar seu emprego numa firma para se dedicar a algo que nem mesmo ela sabe explicar o que é. A partir deste momento é que passamos a acompanhar a jornada dela e de seu namorado e companheiro de apartamento, Naruo Taneda.
Grupo tocando num dos ensaios da banda formada por Taneda, Kato e Yamada |
Observando as reações dessa atitude naqueles ao seu redor e em sua família, que é de uma província mais do interior do país, Meiko passa por um período de descobertas e redescobertas, onde encara todas as nuances do mundo em que vive, principalmente através do seu relacionamento amoroso. Taneda, o outro grande protagonista da história, trabalha como freelancer para uma empresa, realizando tratamento de imagens em trabalhos que serão veiculados para o grande público, mas igualmente, não possui qualquer paixão real pela atividade. Quando encara a realidade do pedido de demissão de Meiko, ele também inicia uma jornada de amadurescimento e busca por realização. Contando com o apoio invariável de seu círculo de amigos, formado pelo imaturo Kenichi Kato e sua namorada por insistência Ai Kotani, e do igualmente imaturo porém mais sério Jiro Yamada, mais conhecido pelo apelido "Billy", o casal passa por experiências marcantes na formação de seu caráter e na própria concepção da união dos dois, que já durava mais de seis anos.
Decidindo ir atrás do sonho principal do grupo, de formar uam banda e transformar o mundo de alguma forma através de sua música, o grupo passa a se reunir para praticar junto e começa a procurar oportunidades junto às grandes gravadoras, encarando, de forma inesperada, a mesma burocracia da qual a vida parecia encher-lhes o tempo e esvaziar-lhes de esperança. Em momentos de grande conflito psicológico, é possível ao leitor crescer junto com seus personagens, elemento o qual é peça essencial das grandes obras, independente da mídia em que é apresentada. Com muito humor, drama, romance e toques de nostalgia, "Solanin" ganha status de uma história que merece ser lida devido ao seu alto nível de sensibilidade sobre o assunto trabalhado. A fim de não estragar a leitura da obra para o leitor, o que de forma alguma pretendemos fazer no blog Quadrinhos Pra Quem Gosta, não revelaremos ou comentaremos sobre alguns excelentes momentos chave da história, entretanto, deixamos aqui nossa sincera e veemente recomendação pela leitura desse material. Publicado no Brasil no ano passado pela editora L&PM em dois volumes de pouco mais de 200 páginas cada, reunindo os 28 capítulos da história (o excelente trabalho recente que a editora L&PM vem realizando com as histórias em quadrinhos, diga-se de passagem, ainda será tema de matéria específica aqui no blog), o trabalho é surpreendentemente pouco conhecido no mercado ocidental, apesar de ter concorrido ao Prêmio Eisner, em 2009, por melhor edição de material estrangeiro publicado nos Estados Unidos.
Capa da versão do mangá lançado no Brasil |
Pôster do filme no Japão |
Adaptado para o cinema japonês em 2009, com a consagrada atriz Aoi Myiazaki no papel de Meiko, e sob a direção de Takahiro Miki, "Solanin" possui em si um caráter sublime. O primeiro trecho do filme pode ser conferido no site Dramacrazy, que pode ser acessado aqui. Curiosamente esquecido na lista do livro "1001 Comics You Must Read Before You Die", publicado ano passado pela editora Cassell Illustrated, que apesar de ser uma editora dos Estados Unidos, contou com a colaboração de Tatsuya Seto, renomada crítica de quadrinhos no Japão, Chie Kutsuwada, entusiasta do mangá e graduando da Escola Real de Arte, em Londres, sem contar o próprio organizador do livro, o americano Paul Gravett, autor do livro "Mangá - Como o Jaão Reinventou os Quadrinhos", a obra de Inio Asano não merece ser relevada, figurando entre estas grandes recomendações com igual merecimento.
O mangá de Asano é, portanto, uma ode ao adeus para a inocência, da fase da vida em que tomamos as principais decisões sobre nossos sonhos e do que estamos dispostos a fazer para ir atrás deles. Tanto na história, quanto em suma, "Solanin" é uma despedida, melodia com a qual a vida segue seu caminho e transforma as pessoas, das formas mais inesperadas possíveis. Simplesmente inesquecível e arrebatadoramente tocante.
NOTA GERAL: 5 ESTRELAS.