sábado, 9 de julho de 2011

Sem Medo?

Por Gabriel Guimarães


Apesar de estar presente entre os super heróis mais poderosos do universo DC, o Lanterna Verde Hal Jordan tem sua verdadeira essência, aquilo que lhe faz ser tão admirado pelos seus leitores recorrentes, não no seu anel, que lhe permite fazer tudo que sua mente desejar, numa abordagem moderna para a lâmpada do clássico personagem literário Aladin, mas sim em sua força de vontade humana, que é justamente o que lhe permite todos os feitos enquanto empunha a arma mais poderosa do universo.

A história de Jordan não é tão conhecida como a de Bruce Wayne ao virar Batman ou a de Clark Kent ao se tornar Superman, porém, de modo alguma, é menos incrível e essencial para se compreender o personagem, suas motivações e sua verdadeira força. Ainda criança, Jordan testemunhou o acidente que causou a morte de seu pai, piloto de testes da Aeronáutica Ferris, num ato de coragem para afastar o avião que pilotava da multidão. Aquele momento definiu a escolha de Jordan como Lanterna, tantos anos antes do moribundo Abin Sur cair com sua nave no meio do deserto norte-americano e mandar seu anel encontrar o ser naquele setor espacial que mereceria ostentar com honra o símbolo da Tropa dos Lanternas Verdes em seu peito e em sua mão.

Para compreender a razão de tamanha importância daquele momento, é preciso conhecer a história da Tropa. Organizada pelos Guardiões, a raça mais antiga do universo, a fim de patrulhar todo o cosmos com o propósito de assegurar a ordem e a paz, a Tropa dos Lanternas Verdes é composta por 3600 membros, um para cada setor espacial, conforme divisão feita pelos seus mestres. Para usar o anel, há requisitos essenciais, dentre os quais, o mais importante é a capacidade de superar o medo, algo que aquele momento tão jovem ainda na vida de Jordan lhe garantiu. Conforme o próprio Hal diz na história "Lanterna Verde: Renascimento",: "Quando o pior de todos os temores acontece diante dos seus olhos, não resta mais nada do que se ter medo."


Eis aí a essência do personagem. Para adentrar em seu universo, seria preciso explicar a origem da Bateria Central de Oa, planeta dos Guardiões, a essência do arqui-inimigo de Jordan, o korugariano T'aal Sinestro, e o ser que era a razão da clássica fraqueza do anel dos Lanternas Verdes contra a cor amarela, Parallax. Porém, acredito que estes pontos sejam um tanto quanto um desvio do tema principal dessa matéria, no momento.

Na última década, a partir de uma estratégia muito bem implementada pela editora DC, o roteirista Geoff Johns revitalizou o personagem de uma forma brilhante mesclando questões ligadas à atualidade dos leitores de quadrinhos às tradições das revistas do personagem publicadas ao longo de décadas desde seu surgimento (conforme já destaquei em matéria aqui no blog). O sucesso foi estrondoso, rendendo muita atenção para toda a mitologia por trás dos Lanternas Verdes e alavancou as vendas dos títulos ligados a ele num nível que poucos poderiam imaginar. Observando esse crescimento da procura por ele, a DC começou a investir na produção de um filme para o personagem (a relação entre a nona arte e o cinema também já foi abordada aqui no blog antes), além de uma série de produções em desenho animado direto para DVD a fim de motivar o público e aquecê-lo para a grande obra nas telas de cinema (uma dessas produções foi analisada também em matéria aqui no blog antes).

 
Howard Murphy como Lanterna
Verde em 1979

Entretanto, todos esses investimentos para a propaganda do personagem não foram algo tão inovador com relação à sua aparição em outras mídias fora dos quadrinhos. Presente em séries de desenho animado desde 1967, Hal Jordan sempre lutou contra o mal de todas as formas que podia, usando de construtos de seu anel que iam do bizarro ao extraordinário. Porém, foi só em 1979 que ele foi interpretado pela primeira vez em carne e osso, pelo ator Howard Murphy no especial para a televisão americana "Legends of the Superheroes", onde o personagem tinha seus poderes roubados por um grupo de supervilões composto por inimigos de vários dos heróis da Liga da Justiça. Curiosamente, essa trama foi construída para que a rede não precisasse gastar muito com efeitos especiais e ainda assim a história parecesse plausível. Anos mais tarde, em 1997, novamente o Lanterna foi personificado por um outro ator, Matthew Settle, que, porém, interpretava Guy Gardner, outro terráqueo Lanterna, no filme "Liga da Justiça da América", baseado na fase humorística que a Liga tinha vivido recentemente pelas mãos de Keith Giffen e J. M. DeMatteis. Diga-se de passagem que Hal se livrou por pouco de ser motivo de piada até os dias de hoje com essa mudança na escalação do anel naquele momento.

Vale aqui uma nota para o excelente trabalho de pesquisa e organização feito pelo blog Pipoca e Nanquim sobre o histórico do personagem antes de seu filme, que pode ser observado tanto no endereço eletrônico deles quanto no seu livro "Quadrinhos no Cinema", publicado pela editora Generale.

Como foi dito anteriormente, a atenção que o personagem vem recebendo nos últimos anos motivou a DC a investir novamente numa encarnação do herói, dessa vez, para um filme de longa duração a ser exibido nas salas de cinema ao redor do mundo inteiro, e o resultado disso poderá ser visto dia 19 de agosto aqui no Brasil no filme "Lanterna Verde", estrelado pelo ator Ryan Reynolds, mais conhecido pelos seus papéis em filmes de comédia, mas que, porém, tem capacidade para protagonizar boas cenas de ação.

É, então, que chegamos ao tema da matéria de hoje. Consegui recentemente um acesso a esse filme, que será lançado aqui mês que vem, o assisti, e venho aqui dar alguns comentários sobre minhas impressões que podem ser observadas durante o filme (há algum tempo atrás, fiz duas matérias que já visavam comentar sobre o andamento do projeto desse filme que podem ser vistas aqui e aqui no blog). A fim de garantir o direito de cada leitor para tomar conhecimento até onde ele próprio decidir, alerto que a partir deste momento, estarei comentando sobre partes do filme e que a decisão de ler o que vem em seguida deve partir única e exclusivamente de cada leitor (já fiz uma matéria sobre essa questão do spoiler que pode ser vista aqui no blog, também).


ALERTA: SPOILER




Visando mostrar o momento em que Hal Jordan recebe o anel da Tropa e se torna o Lanterna Verde responsável pelo setor espacial 2814, o filme inicia destacando o confronto entre Abin Sur e Parallax. Apesar do altíssimo investimento em efeitos visuais no filme, o vilão não consegue lembrar tanto sua figura nos quadrinhos, entretanto. Além disso, sua origem e a razão de este ter desejo pela destruição dos Guardiões são extremamente diferentes dos que existem nos quadrinhos. Enquanto nos quadrinhos, ele é aprisionado na Bateria Central de Oa para que seja contido, causando assim a impureza amarela, no filme, Parallax é inicialmente utilizado como forma de dar mais poder à Tropa dos Lanternas Verdes, uma vez que a luz verde não seria tão capaz de muní-los ao redor de todo o universo, o que acredito ser uma justificativa deveras fraca e que reduz aquilo que a força de vontade por trás da história dos Lanternas Verdes a algo insignificante.

Quando o filme chega à Jordan, vivido por Reynolds, vemos que este é um irresponsável de marca maior, que, porém, possuí uma característica que, em hipótese alguma poderia ter,: medo. O Jordan dos quadrinhos pode ser irresponsável, porém, tem um senso de luta muito grande. A morte de seu pai o entristece, porém, também lhe dá forças. O exemplo de seu pai é um dos elementos que mais o motiva a fazer tudo que faz, não fosse por isso, com certeza, Hal não teria se tornado piloto de testes, seguindo o seu legado. No filme, a abordagem do momento da morte de figura tão importante é feito de forma extremamente trivial e convencional demais, e os efeitos deste momento em Jordan, também.

Para que não seja tão criticada assim as atuações do elenco de atores, o roteiro do filme possui largas falhas estruturais e demonstra uma superficialidade excessiva em momentos que deveriam ser mais aprofundados. Diferente do trabalho excelente que em sendo realizado pelo diretor Christopher Nolan no Batman, o filme do Lanterna, infelizmente, não acerta no tom que é dado à película, adotando em muitos momentos estilos próximos ao cômico ou ao clássico de heróis e personagens sem sal.

Continuando, o filme tem uma quantidade de efeitos especiais bastante numerosa, porém, a qualidade destes não consegue agradar tanto assim a vista. Muitos dos demais membros da Tropa mostrados nas cenas em Oa poderiam ficar melhor se utilizassem processo similar ao realizado em filmes como "MIB - Homens de Preto", apesar de que há exceções para isso. As representações feitas de Abin Sur, Kilowog e Tomar-Re estão muito bem trabalhadas e com um nível de detalhamento fantástico. A forma como o traje dos Lanternas se adapta à fisiologia específica de cada raça que o usa também está muito bem mostrada, e merece destaque por isso. O traje que Jordan usa, todavia, não agrada tanto, e poderia ter sido melhor desenhado.


Peter Sarsgaard como Hector Hammond,
um dos grandes destaques do filme


Um dos personagens que realmente chamou a atenção, porém, foi o vilão Hector Hammond. Apesar de estar em um contexto diferenete dos quadrinhos, uma vez que, no filme, ele é um professor de biologia, enquanto nos quadrinhos, era um cientista especializado em astrofísica, o personagem realmente ganha vida na história, e a atuação de Peter Sarsgaard dá um toque especial nisso. Este ponto merecia ser comentado.



Dois outros pontos que merecem ser comentados aqui são a participação da manda-chuva Amanda Waller, bastante abaixo do padrão que criou na série de desenho animado da "Liga da Justiça - Ação Sem Limites"; e a aparência dos Guardiões, que está quase oposta à dos quadrinhos, já que são representados como seres de fisionomia esguia e elevada, enquanto na nona arte, são seres de baixa estatura e bem mais numerosos.


Cena do filme com Amanda Waller aparecendo em segundo plano
A linha de roteiro, porém, não é muito positiva, e chega ao clichê em diversos momentos, bem mais até do que seria aceitável. Para ser absolutamente sincero, creio poder resumir o filme em uma frase: "Lanterna Verde" é um filme feito para os anos 1990, com uma trama estereotipada nos padrões da época, porém, com efeitos especiais dos dias de hoje.
Infelizmente, o personagem não conseguiu atingir todo o potencial que poderia, e nós, leitores e admiradores da arte sequencial em que suas histórias são contadas, vamos ter que esperar um pouco mais de tempo até vê-lo em sua posição devida. Ainda assim, como filme isolado da produção de quadrinhos, pode agradar a alguns que estejam querendo assistir um filme tradicional sobre mocinhos e bandidos. Fica a cargo de cada um a decisão de assistir ou não, e tirar suas próprias conclusões. Convido desde já, inclusive, quem o vier a fazer, para dividí-las conosco aqui nos comentários. Quanto ao quesito adaptação, continuemos aguardando nosso dia mais claro.

NOTA GERAL: 1 estrela.


4 comentários:

Nuno Amado disse...

Bem, GG... tenho de ver para depois comentar!
Eu sou fã do "verdocas" tenho alguns livros muito raros e valiosos dele, e gostaria que o filme fosse feito minimamente de acordo com a filosofia que preside à actuação do Hal Jordan e restantes Lanternas... Já me deixaste um pouco triste com a tua apreciação!
:(

Anônimo disse...

Sou fã do lanterna verde e sei que muita gente que vai ao cinema assistir ao filme não sabe absolutamente nada sobre ele. Se o filme conseguir explicar o conceito do personagem como homem de ferro conseguiu pra mim já tá bom

GG disse...

Bongop, é justamente pra evitar esse tipo de reação dos tantos admiradores de quadrinhos como eu, que eu não costumo fazer tantas resenhas nesse estilo, porém, como consegui acesso a esse material de forma tão inesperada e que com certeza interessaria a tantos fãs do Lanterna, entendi que valia a pena comentar sobre ele. Como disse, o filme daria muito certo mesmo se fosse feito para o público dos anos 1990, pois segue muitos dos elementos básicos dos filmes daquela época, porém, com efeitos especiais de hoje. O roteiro, entretanto, não conseguiu dar força aos personagens ou à mitologia do Lanterna Verde como poderia, entretanto. O filme, como filme é legalzinho, porém, como adaptação, não tenho como considerá-lo algo de muita qualidade, infelizmente. Convido-o, porém, a asssistir o filme e tirar suas próprias conclusões, e depois compartilhá-las aqui conosco, pois com certeza acrescentará muito às discussões sobre a relação desse filme com as HQs.

Anônimo, o filme explica a mitologia do personagem de uma forma um tanto fria e sem tanta emoção, como é possível ver nas HQs, porém, pode ser um tanto eficaz, sim. Como mencionei na matéria, a relação dos Guardiões com Parallax se dá de uma forma completamente diferente da dos quadrinhos, e houve algumas mudanças um tanto desnecessárias que foram feitas. Quanto à mitologia de Hal Jordan, esta está absurdamente diferente da original, e não acredito que Ryan Reunolds tenha conseguido interpretar o personagem tão bem quanto Robert Downey JR conseguiu com Tony Stark. Homem de Ferro foi tão bom porque tanto respeitou o lado Homem de Ferro quanto o lado Tony Stark, pendendo mais para esse último. O mesmo não aconteceu no filme do Lanterna Verde, apesar de tudo. Ainda assim, recomendo que vá assisti-lo para tirar suas próprias conclusões pessoais.

IgorTavern disse...

Assisti ao filme em 3D, já que 98% das salas no RJ as sessões eram assim. Muitos acharam uma bomba, eu acabei gostando, apesar das gritantes mudanças e do Reynolds exagerando muito na atuação. Acredito que o Parallax foi mostrado daquela forma, já no em um corpo, para não estragar o que pode vir a ser a trama do segundo filme (a propósito, viram a cena pós-créditos?) que deve ser focado na real entidade buscando possuir o Hal ou o Sinestro. A Tropa não ganhou tanto destaque porque a história quis dar ênfase no aprendizado do herói.