Por Gabriel Guimarães
O objetivo das grandes histórias em quadrinhos sempre foi o mesmo: cativar o leitor e inserí-lo no universo onde os personagens que protagonizam as histórias estão. Quando essa missão é bem sucedida, a procura pelas revistas com essas aventuras naturalmente cresce, e, com ela, a ansiedade por saber o que vai acontecer a seguir no decorrer da trama. Essa vontade de saber e de poder contar o que acontecerá em seguida nas obras ficcionais é conhecida como 'spoiler'.
Formulada depois do surgimento da internet, em função do desencontro temporal e geográfico entre os velhos e novos meios de comunicação, o termo em si surgiu a partir de um determinado evento que ocorria há muito tempo atrás nos Estados Unidos, quando um programa de televisão era exibido na Costa Leste três horas antes do que era Costa Oeste. Os espectadores da Costa Leste, então, ávidos pelos acontecimentos que acabaram de testemunhar no episódio da semana de seus seriados favoritos, partiam para os portais de discussão e divulgavam abertamente tudo que aconteceria no episódio, além de propor interpretações pessoais e determinar valor a determinados momentos em detrimento de outros. Quando alguém da Costa Oeste acessava esses portais ou tinha qualquer forma de contato com essas informações, toda a graça que o episódio possuía pela sua inviolabilidade, ou seja, o desconhecimento por todos do que de fato aconteceria, era estragada (ou era, como se diz em inglês, 'spoiled'). A esses usuários da Costa Leste que postavam o conteúdo dos episódios antes da sua exibição por todo o território norte-americano, passou a ser, então, dado o título de 'spoilers', a fim de obrigá-los a anunciar nos seus comentários que lá haveriam dados privilegiados da trama que era acompanhada, dando assim, a todos os espectadores e internautas um direito de escolha sobre até que ponto pretendiam saber de antemão os mistérios que os fascinavam ou não.
Com o decorrer dos anos, a dimensão dessa ação acabou se expandindo, atingindo todos os meios de comunicação que produziam conteúdo ficcional e que era consumido em espaços e tempos diferentes. O âmbito internacional disso, talvez, seja o que mais está em destaque hoje, onde um determinado programa, revista em quadrinhos ou até livro é disponibilizado primeiramente em um ponto do mundo e a informação sobre tudo ali exposto logo é distribuida através da rede das mídias digitais para o mundo inteiro.
Até aí, esse tema é muito bem documentado. Há blogs, sites e programas quase que exclusivamente voltados para isso. Os seus leitores ou espectadores habituais não reclamam do que é feito lá, pois estão cientes da proposta desses locais e estes oferecem exatamente aquilo pelo qual eles procuravam para consumir. Seriados como LOST e Survivor foram grandes exemplos disso, agregando milhares de fãs dos seriados para debater sobre temas dos episódios, sobre a origem e/ou desfecho de determinado personagem na trama ou simplesmente sobre o funcionamento do universo ambiente das estórias. Agora, apesar de toda a estrutura de existência positiva dos spoilers como instrumentos de discussão entre os mais diferentes grupos de admiradores dessas obras, há diversos casos de completo descaso com o leitor ou espectador assíduo de determinado meio de comunicação.
Como aqui procuramos focar os estudos midiáticos e análises à nona arte, existem muitos casos que merecem ser destacados, em prol dos verdadeiros fãs de quadrinhos, que são severamente prejudicados por atitudes egoístas e desconsiderativas por parte de repórteres completamente desprovidos de consciência moral, que acabam por quebrar o laço ético que rege o fluxo de informações entre os profissionais do meio e os leitores do mesmo. No portal eletrônico do Globo, já testemunhei mais de um caso dessa impensada atitude, onde não foi dado ao internauta esse direito de escolha de conhecer ou não o porvir ficcional: aqui e aqui (ALERTA: SPOILER - Nestes links, há spoilers para eventos futuros nas histórias dos personagens Marvel). A chamada para estas matérias, que se encontravam na página inicial do portal não apenas desrespeitam o leitor dos quadrinhos como denigrem as histórias produzidas pela Casa das Ideias frente aos olhos públicos dos demais internautas, que perdem qualquer interesse de acompanhar as revistas para saber o que vai acontecer ao final de cada título, uma vez que essa informação é dada de forma gratuita no título das reportagens.
Acredito que essa postura não pode mais ser tolerada nos dias atuais, onde a liberdade de expressão é direito de todos, o que inclui, claro, o direito de se surpreender com as obras que se acompanha ou não, e de ser respeitado por isso. Cabe, agora, a nós, leitores e admiradores da arte sequencial, lutar por nossos direitos e não cedermos enquanto não formos reconhecidos e respeitados.
12 comentários:
Adoro Spoillers, como meio de discussão de determinado assunto, mas deve-se mesmo ter respeito aos fãs que preferem a surpresa...
Com certeza, Daniel. De forma alguma eu condeno a divulgação dessa informação prévia para debates e conversas amistosas, porém, eu sou contra a falta de liberdade de escolha quanto ao que se quer saber ou não das histórias que ainda serão publicados, algo que cabe apenas ao próprio leitor em particular determinar.
Opa, tudo bem? Cheguei aqui por indicação do @GGMF no twitter.
Eu tenho um site que trata, quase exclusivamente, de notícias. HQ's, cinema, games, séries, cultura pop em geral. É extremamente difícil deixar de fazer uma notícia por causa de spoiler.
Como diria o Silvio Luiz, "o que eu vou dizer lá em casa?". Eu não coloco que o Homem-Aranha vai morrer e todos os outros sites colocam e o leitor do meu pensa: "opa, os caras são descuidados/desinformados". Não publicar, acaba sendo um desrespeito também, porque você falha com a sua intenção de trazer sempre o que há de novo.
Por um lado, concordo que é chato saber de certas coisas sem querer. Lembro que na época dos livros do Harry Potter, eu estava lendo o 6º e, um dia, entrei num site temático que tinha um fórum e o site exibia os últimos tópicos do fórum na homepage. Um dos tópicos daquela hora era: "Como o Snape pôde matar o Dumbledore?". Balde de água fria total pra continuar a leitura.
A política que tento seguir no Supernovo é: eu sempre aviso quando uma notícia tem spoilers. Sempre digo: "Olha, a partir daqui a notícia tem spoilers, então segue por sua conta e risco". Porém, no caso do Homem-Aranha por exemplo, quando o NOME DO ARCO é: "A Morte do Homem-Aranha", é complicadíssimo fazer uma manchete sem usar o spoiler, que acaba nem sendo spoiler, porque já todo mundo sabe e é essa a intenção da Marvel. Todo mundo já sabe que ele vai morrer, querem ver como.
Pra concluir: é complicadíssimo evitar noticiar um spoiler quando a própria editora/emissora/estúdio divulgam o spoiler aos quatro ventos. Mas quando possível, deve-se prevenir o leitor sim. Quando possível.
Essa sua postura de anunciar o spoiler antes de o fazê-lo é exatamente o que eu acho que é mais correto de fazer, Supernovo.net. O que quis expôr aqui na matéria foi como isso às vezes é desrespeitado de formas que poderiam ser evitadas. Para um site de referência sobre todos os assuntos como a Globo, há realmente muito mais que se pode falar de quadrinhos do que algumas poucas reportagens curtas cujo único apelo e contar já no título dela o fim de uma importante história que sequer chegou no Brasil ainda. Sites como o seu, que alertam sobre a presença de spoiler, como também o fazem o Omelete e o Universo HQ, são exemplos de como isso pode ser trabalhado de forma positiva, sendo, portanto, um trabalho a ser espelhado em outros portais.
Oi, Gabriel. Concordo com tudo o que falou. Acho um desrespeito também esses pseudo-jornalistas, que, e3m nome do furo jornalístico, acabam é dando é uma furada.
Fiquei possesso com a história da morte do Tocha Humana, pois a Marvel vinha publicando vários teasers, atiçando a curiosidade dos leitores e aparece um imbecil (nesse caso, foi o UOL) e publica na primeira página. O G1 também é perito em fazer isso.
Recentemente, aconteceu também com um amigo meu, que viu no Omelete uma cena pós-créditos do filme do Lanterna Verde e me contou via MSN. Fiquei doido de ódio. Claro que é impossível fugir dos spoilers nos tempos de internet, mas também é preciso um pouco de bom senso na hora de usá-los.
Discordo do comentário do Supernovo, que disse que, se não publicar, vão pensar que ele é desinformado. Há modos e modos de se publicar uma informação e é aí que entra a especialização do autor do texto em saber transmitir uma novidade sem estragar uma surpresa.
O bom jornalista é aquele que sabe trabalhar seu texto de modo que o leitor, ao ler sua crítica, se interesse ainda mais pelo assunto e vá buscar a fonte ou mais informações a respeito. Tomara que seu texto repercuta a ponto de despertar a consciência desses caça-furos e os ensine a ser mais profissionais e menos desmancha-prazeres. Abraços!
Mutante X, compreendo sua postura contra a exposição de spoilers por parte das mídias digitais que estragam as novidades dos meios de comunicação que acompanhamos, no caso, os quadrinhos. Porém, o Supernovo.com tem um ponto válido. Para um portal de notícias de quadrinhos e cinema é extremamente difícil fugir à divulgação de spoilers. A postura que o site dele tem, porém, de alertar o leitor quando tal recurso é utilizado é o que eu acredito ser o mais correto. Os spoilers podem ser usados para feedback do público com os criadores das obras, e do público entre si, expandindo o universo em que a história ficcional se desenrola e atraindo muitos novos leitores. Ou pode decepcionar um possível leitor de quadrinhos ou qualquer outro meio cujo próximo passo tenha sido divulgado de forma errada. Tudo depende da forma como se dá a comunicação. O bom e velho Chacrinha bem dizia "Quem não se comunica, se trumbica!" e isso é fato nos dias de hoje mais do que nunca.
Com certeza, não quis criticar o Supernovo por divulgar spoilers, apenas discordei do fato dele dizer que, se não publicar, é taxado como desinformado. Acho que não é bem por aí. É válido o recurso de alertar o leitor como ele faz. E também é ético. A crítica pesada mesmo é para quem faz isso de forma descarada e desrespeitosa. Em nome do furo, nem sempre vale tudo.
Eu concordo plenamente com você, Mutante X. Sei que não direcionou nenhuma crítica ao Supernovo.com, só mostrou seu ponto de vista. Acredito que todos têm direito a essa escolha. Também já me decepcionei muito com certas reportagens que estragaram finais muito aguardados para histórias que eu seguia. Minha matéria de hoje já estava sendo fermentada há algum tempo por uma série de fatores, e hoje finalmente ficou pronta. O fato de estar gerando esse debate demonstra o quanto esse tema afeta a todos os envolvidos com as histórias em quadrinhos. É algo que precisa ser visto todos os lados para se chegar ao melhor consenso possível, com certeza. =)
Em geral não ligo de receber spoilers "inofencivos", mas é claro que tem coisas (como o final de um filme ou livro que vc está querendo mto assistir/ler) que definitivamente a gente não quer saber com antecedência para não perder a graça. Acho certo adotar a postura de avisar ao leitor que a partir daquele momento o texto terá revelações sobre o enredo, pois assim ele pode decidir se quer ou não ter acesso àquela informação.
Exatamente, Tássia. Acredito que informar não é o problema, o problema é apenas dar a liberdade ao leitor de prosseguir além do campo de momento ou não. Ler a parte de spoiler de uma notícia é questão de escolha, encontrar uma matéria que é puro spoiler sem qualquer senso de limite ou respeito com o leitor, é outra completamente diferente.
Achei interessante sua discussão a respeito dos spoilers. No meu blog, quando vou apresentar minha análise sobre determinado filme, livro, etc., eu não costumo muito aprofundar a respeito dos detalhes, das minúcias da obra. Eu falo de uma maneira geral. E se por acaso eu acabe entrando em detalhes, eu coloco um pequeno aviso para que o leitor não se sinta lesado.
De fato, a forma como alguns veículos de informação divulgam as notícias nesse meio, acabam por desrespeitar-nos. Acredito que isso acontece porque as pessoas que se "metem" a escrever sobre o assunto tem pouco ou nenhum conhecimento sobre, e dessa maneira não demonstram nem um pingo de sensibilidade.
Essa postura sua é a correta, Andhora. O que eu quis realmente trazer pra uma discussão saudável aqui é até que ponto o noticiar de um evento nos quadrinhos, filmes, etc, afeta o direito do leitor, espectador, etc, quanto a até que ponto este quer saber antes da hora o que vai acontecer nas histórias que acompanha. Acho que a melhor solução pra esse problema realmente é simplesmente usar o bom senso e se pôr no lugar do leitor das matérias, mas isso, com certeza, ainda vai render muito o que falar. Fiquemos atentos.
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