Por Gabriel Guimarães
Há três anos, a editora Conrad publicou uma história em quadrinhos sobre a vida do marinheiro que iniciou o movimento social que veio a ser conhecido como a Revolta da Chibata em 1910, João Cândido, ou, como era mais conhecido, o Almirante Negro. A obra trata-se de "Chibata!", produzida pelo roteirista Olinto Gadelha com belíssimos desenhos de Hemeterio, ambos nascidos em Fortaleza, capital do estado do Ceará. À época, a qualidade do material chamou bastante atenção nas livrarias, tendo talvez o uso do contraste entre luz e sombra sido o seu grande trunfo visual.

Para os bons leitores de histórias em quadrinhos, essa obra não pode faltar à coleção, pois simboliza bem o quanto uma história real brasileira pode emocionar, se contada de forma instigante e sensível. Falo com certeza que essa obra possui um grau de destaque dificilmente encontrado nas obras brasileiras, e a admiro muito por isso.

Iniciada em maio de 2010, a ação ainda estipulou o pagamento de indenização por danos morais e materiais, em função da distribuição e comércio de duas edições da obra, além do recolhimento de todas os volumes disponíveis no mercado destas. A editora, em resposta, afirmou que recorrerá da decisão da juiza da 2ª Vara Cível do Fórum de Pinheiros, alegando que a HQ se baseia em dados históricos. Um tanto independente do resultado, levantou-se com essa disputa uma questão, que passou a ser discutida depois da divulgação da disputa judicial: a responsabilidade de publicar uma história de teor original que não fira a integridade de outras obras e autores que já discorreram previamente sobre o assunto que esta aborda é de quem, principalmente? Ela é obrigação dos produtores da obra (roteiristas, desenhistas, arte-finalistas, etc) ou deve ser algo a cargo da editora que publica a história?
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Arte de Alex Ross para o Batman, mostrando seus ferimentos de batalha |
No Brasil, as editoras claramente têm em mãos uma capacidade de se defender contra esse tipo de acusação muito melhor do que os produtores individuais das obras, e a forma como se dá a disseminação de uma influência aqui é algo que merece um olhar muito atento, uma vez que em meio a uma miscigenação cultural tão grande, as obras que são criadas sempre acabam usando de referências encontradas em outros materiais publicados ou encenados previamente com os quais os autores tiveram contato. A página 40 de "Chibata!", por exemplo, eu vejo claramente como resultado da influência do desenho que o artista norte-americano Alex Ross produziu para o personagem Batman exposto ao lado, porém, uma alegação de plágio nesse caso seria algo um tanto radical, a meu ver, uma vez que quando se pesquisa imagens sobre a chibata, encontra-se esta que destaquei aqui entre elas, que também pode ser fácil e igualmente atribuída como referência para a página da HQ. Caso as acusações de Vieira quanto ao uso impróprio de suas criações e diálogos sejam confirmadas, caberá uma nova discussão sobre estes termos de responsabilidade que descrevi, e com certeza atentaremos para um diálogo em que ambos os lados da história estejam em pé de igualdade, a fim de que quem vença no final das contas seja o patrimônio cultural a que todos temos direito.
De qualquer forma, essa notícia é importante para o mercado editorial como um todo atualmente, pois a ocorrência de plágio é algo extremamente nocivo para quem sofre a partir dele e principalmente para quem o pratica, e é preciso que hajam medidas para evitá-lo. Ainda assim, acrescento: apesar desses pontos destacados que pesam no pré-julgamento da obra "Chibata!", permaneço com minha opinião de que se trata de uma obra nacional com altíssima qualidade e que merece ter seu reconhecimento como produto cultural. Aos que não tiveram ainda contato com ela, recomendo que o façam, pelo menos enquanto ainda há tempo.
2 comentários:
Achei muito interessante o post. Fiquei com vontade de ler esta HQ.
"Chibata!" realmente é uma HQ de alta qualidade produzida no Brasil, e se você quiser mesmo le-la antes que a justiça recolha todas as edições disponíveis ainda no mercado, Tássia, aconselho que você corra, infelizmente. Enquanto isso, torcemos para que tudo se resolva bem entre as partes nessa disputa judicial e que, em breve, essa excelente história em quadrinhos possa novamente estar à venda nas livrarias ao redor do país e nas bibliotecas escolares.
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