Por Gabriel Guimarães
Os organizadores da Rio Comicon, por meio de um informe oficial postado no site do evento ontem (que pode ser conferido aqui), anunciaram que, este ano, não haverá a esperada terceira edição da reunião internacional de fãs e produtores de quadrinhos na cidade do Rio de Janeiro, devido a problemas no acordo com os patrocinadores e demais questões relativas à verba necessária para custear o porte cada vez maior da ocasião.
Tendo acontecido nos últimos dois anos, e cujas coberturas completas foram feitas aqui no blog (as quais podem ser conferida aqui e aqui, respectivamente), a Rio Comicon deu um gatilho inicial numa nova geração de admiradores da arte sequencial nas terras cariocas e trouxe para perto do público profissionais de renome que jamais haviam posto os pés no Brasil, como o roteirista Chris Claremont, o desenhista Kevin O'Neill e a mangaká Junko Mizuno. Apresentando exposições maravilhosas sobre grandes artistas que se consagraram no meio, como o americano Will Eisner e o italiano Milo Manara, além de oferecer ao público a oportunidade de conhecer os estilos mais diversos dos artistas nacionais, apresentados nos esquetes que ficavam no meio do grande pavilhão da Estação Leopoldina, o evento estimulou uma nova geração a conhecer mais da cultura da nona arte que se desenvolvia pelas beiradas dos meios de comunicação mainstream. Apesar de terem suas limitações físicas e de verba, as duas edições do evento foram muito bem sucedidas, e resgataram uma quantidade de leitores considerável para a leitura da arte sequencial.
Materiais do escritório de Eisner estiveram expostos em 2011 |
As portas abertas pela Rio Comicon para os eventos de quadrinhos no Rio de Janeiro foram imprescindíveis para o panorama positivo com que vemos a arte sequencial hoje. Apesar de encontrar resistência na escassez de investidores de grande porte e da visibilidade do evento, os organizadores conseguiram promover o lançamento de novos artistas, que deram seu primeiro passo profissional nos corredores onde outrora a população pegava os trens para ir para o trabalho ou voltar para suas casas. Não deixa, portanto, de ser um fato particularmente curioso este modo de promover os aspirantes a quadrinistas, uma vez analisada a similaridade desse início profissional em pleno Século XXI com a forma como a própria cultura de massa começou a se expandir, através dos folhetins nas estações ferroviárias do Século XIX.
Imagem usada para ilustrar os membros do site "Jovem Nerd" em seu popular podcast |
Nestes dois anos, porém, foi possível observar alguns aspectos de considerável importância que foram relevados ou mesmo não trabalhados por conta dos organizadores do evento e que, caso fossem, talvez a edição deste ano tivesse condições de ser realizada. Dentre eles, a captação de parceiros para montar estande no evento chama bastante atenção. Contando apenas com a Livraria da Travessa e deixando de lado grandes nomes do mercado nacional livreiro como as livrarias Saraiva, FNAC e Cultura, além das lojas especializadas Point HQ, Comix e Devir, é um tanto restritivo demais. A participação destes demais, não como forma de competição agressiva pelo leitor, mas como ferramenta de diversidade para consumo do visitante do evento, é um fator bastante importante. A ausência de bancos eletrônicos 24 horas nas imediações é outro aspecto relevado que pesou muito para muitos dos presentes nestes dois últimos anos. A ausência de um sistema geral de pagamento via cartão de crédito nos estandes dos quadrinhos independentes acabava, por conta disso, inviabilizando a compra de material nacional de qualidade e de expansão de percepção da nossa realidade brasileira.
Observando de um ponto de vista mais focado na visibilidade do evento, destaca-se também a ausência de anúncios do evento nas mídias impressas, estando concentrada principalmente nas redes sociais, que apesar de serem extraordinárias para a replicabilidade dos anúncios do evento, não dão o suporte físico muitas vezes necessário para atrair o público alheio. Procurar a parceria de grandes centros da atenção online, como os sites Omelete e Jovem Nerd poderiam ser uma opção muito interessante, sem ter que sair do panorama virtual, mas a presença maior da marca da Rio Comicon no cenário público carioca real seria, certamente, de grande importância. Um anúncio mais antecipado sobre o evento também seria um fator muito elogiado pelo público, pois este, em geral, tem sido feito muito em cima da hora, ocasionando problemas de agendamento dos visitantes para com as oficinas e palestras oferecidas.
Um terceiro aspecto que vale a pena ressaltar é a falta de suporte dado por alguns dos estandes presentes no evento nestes dois anos, cujo principal exemplo é o da editora Panini, responsável pela publicação no território nacional de grande parte dos produtos mais consumidos entre os leitores de quadrinhos. Apesar de ter percebido o resultado incrivelmente positivo que teve na última edição da Bienal de Livros do Rio de Janeiro, ano passado (que foi completamente coberto aqui no blog, também), a ponto de já confirmar um estande maior ainda do que o utilizado para a próxima edição da Bienal, a editora insistiu nos dois anos em estar presente no evento apenas com uma pequena bancada oferecendo pacotes de assinatura mensal de seus títulos. A demanda do público era imensa, mas a oferta de material era muito escassa, e não dava vazão, gerando insatisfação em muitos dos visitantes presentes.
Por quase duas décadas, enquanto não houve atividades relacionadas à arte sequencial no Rio de Janeiro, uma grande comunidade permaneceu inerte, sem saber por onde ganhar voz para sua paixão, mas isso terminou com a realização da primeira Rio Comicon. Só neste ano, a quantidade de eventos relacionados a quadrinhos, que aconteceram nos mais diversos bairros da cidade, é extremamente maior do que fora anteriormente, e o público continua faminto por mais. Talvez nenhum destes eventos de 2012 tenha tido o mesmo porte que a Rio Comicon oferecia, mas foram, sem dúvida, fonte de memórias espetaculares, bons encontros entre autores nacionais e estrangeiros, e uma forma maravilhosa de fazer novas amizades e adquirir contatos. Não choremos pelo cancelamento da Rio Comicon deste ano, pois temos certeza do empenho dos organizadores para com o público e para com a arte que eles vêm trabalhando há anos. Torçamos apenas para que possam confirmar a edição de 2013 em tempo mais promisso a boa resposta do público, e que possamos mais uma vez nos reunir pela nossa sincera admiração à arte sequencial.
Nós, do Quadrinhos Pra Quem Gosta, desejamos apenas o melhor para todos os organizadores da Rio Comicon, e deixamos com vocês nosso apoio irrestrito, nos disponibilizando para tentar ajudá-los da melhor maneira possível. Que possamos juntos, enquanto forma de expressão de toda uma comunidade de leitores e artistas, elevar essa arte que tanto nos engrandeceu ao longo do tempo por experiência e empolgação. Aguardamos os futuros pronunciamentos no belíssimo site do evento, que pode ser conferido aqui, ou clicando na figura acima.